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quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Entrevista com Marcos Prado o produtor de Estamira

bem, para complementar o post do filme Estamira, que é um otimo filme por sinal estou disponibilizando essa entrevista do produtor do filme para voces ficarem sabendo o que aconteceu durante e depois do documentario ;D


O porta-voz
Fotógrafo de formação, Marcos Prado é produtor de alguns dos documentários mais premiados dos últimos tempos, como Os Carvoeiros e Ônibus 174. Desde que decidiu acompanhar a vida de Estamira no Jardim Gramacho, ele a adotou como uma grande amiga, que mantém sempre amparada. Aqui, o diretor fala sobre ela — e sobre todas as discussões levantadas por seu documentário, que recebeu 24 prêmios em festivais no Brasil e no exterior.
Como está Estamira hoje?
Marcos Prado. Ela está tomando muito remédio, mais dopada, perdeu aquele ímpeto de quando o filme foi feito. Quando eu me encontrava com ela era muito gratificante. Fomos criando uma amizade, falo com ela duas, três vezes por semana. Cuido de todas as maneiras que eu posso, ela não mora mais naquele barraco, tem uma casinha sendo construída. Minha vida mudou tanto, respirar e viver tudo aquilo, que eu não poderia me desligar.
O que ela achou do filme? Ela foi a primeira pessoa a ver e falou: “Marcos, tem vezes em que eu não me reconheço, mas eu sei que veio de mim, então acredito. Te dei a missão de revelar minha missão. Então não vou falar pra tirar ou colocar nada. Se você acha que é isso, é isso”. Eu entrei numa crise de consciência, achei que tinha de ser mais cuidadoso. E tirei várias coisas. Quando passei o filme em São Paulo dois anos atrás, não havia a parte em que ela briga com o neto. Mas depois pensei: “Não posso santificar a Estamira. Só colocar as coisas mágicas, poéticas. Ela não é só isso”. Então, voltei com os esporros, os filhos, o neto, a exposição toda.
E a família, o que achou? O Ernani, filho mais velho, que aparece um pouco como o vilão, me falou: “Eu sou isso aí mesmo, uma pessoa religiosa, crente”. Acho que ele não gostou da posição dele no filme, que é a do cara que não fala mais com a mãe, que acha que ela é possuída pelo demônio. Mas não se opôs. A família fica feliz por eu ajudar a mãe. Eu dou dinheiro todo mês, dei telefone, levei no meu médico. Foi um encontro maravilhoso que tive na vida.
Ela tem momentos muito eloqüentes. Onde ela aprendeu tudo isso? Eu sei que ela tentou fazer um supletivo uma época da vida. Mas virou mendiga, andava pelas estações de trem. Foi tão para o buraco que o lixão foi a maneira de se reconectar. Ela é inteligente, e essa linguagem faz parte disso. Não sei se ela leu coisas em algum lugar. Sei que sabe ler e escrever. Mas você encontra ali idéias profundamente filosóficas. O discurso dela tem conceitos milenares.
O filme foi premiado, mas também recebeu críticas negativas. Como lida com elas? O documentário ganhou 24 prêmios e foi traduzido pra francês, espanhol e inglês. Muita gente gostou. Mas também recebi críticas pesadas. Disseram que era antiético, que eu não poderia filmar alguém que não tem capacidade sobre si mesma. Quem disse isso não entendeu nada, porque ela sabe muito bem o que está dizendo. O filme gera debate. Não é pra divertir, é pra conversar, questionar, gostar ou não gostar.
Também disseram que o filme faz uma estetização da miséria. Li isso e acho um absurdo. Estetizar a miséria seria transformá-la numa coisa maravilhosa e não passar o recado, perder o valor. Não acho que isso acontece no filme. Estou mostrando que o lixo é lindo? Estou valorizando a miséria? O que é estetizar?

Fonte: Revista Tpm

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Filme Estamira

SINOPSE
ESTAMIRA conta a história de uma mulher de 63 anos que sofre de distúrbios mentais e vive e trabalha há mais de 20 anos no Aterro Sanitário de Jardim Gramacho, um local renegado pela sociedade, que recebe diariamente mais de oito mil toneladas de lixo produzido no Rio de Janeiro. Com um discurso eloqüente, filosófico e poético, a personagem central do documentário levanta de forma íntima questões de interesse global, como o destino do lixo produzido pelos habitantes de uma metrópole e os subterfúgios que a mente humana encontra para superar uma realidade insuportável de ser vivida.


"EU, ESTAMIRA, SOU A VISÃO DE CADA UM."

Esta é a definição que Estamira, uma mulher de 63 anos, se dá. Marcos Prado revelou ao mundo, através de um documentário, a senhora que, há 20 anos, divide espaço com o lixo despejado no Aterro Metropolitano de Gramacho, no Rio de Janeiro. Lúcida e ao mesmo tempo louca, diz que sua função é “revelar a verdade, somente a verdade”. Estamira é mãe de três filhos e habita, sozinha, um barraco de chão batido, do qual se orgulha, pois fruto de seu trabalho garimpando o lixo.

Lixo. Não é assim que gosta de se referir ao aterro, um lugar insólito e insalubre, onde crianças e adultos disputam restos de comida com urubus, cavalos e cachorros. “É um depósito dos restos; às vezes é só resto e às vezes vem também o descuido. Resto e descuido (...) quem economiza tem (...) ficar sem é muito ruim.”

Sua história de depressão e indignidade é capaz de incomodar. Aos 12 anos, foi estuprada por seu avô materno que a deixou em um prostíbulo onde conheceu um homem que a levou para casa. “Ele era mulherengo.” Casada pela segunda vez, com um italiano, protagonizou uma história de agressões e humilhação. “Esse também era mulherengo.” Uma briga travada por troca de ameaças pôs fim a mais um casamento. Chegou a morar na rua. Sua filha menor, adotada por outra família, a ajudava a esmolar. “É triste, muito triste.”

A lembrança do sofrimento que sua mãe carregara, é ferida na alma de Estamira. Carrega na memória, talvez a fase mais lúcida de sua vida: o clamor de sua mãe quando internada no Hospital Psiquiátrico Pedro II, em Engenho de Dentro – “Estanira (era assim que se referia à sua filha Estamira), me tira daqui, Estanira!”


“Eu posso revelar quem é Deus.”

Em sua vontade de ser vista e ouvida, Estamira repete que veio ao mundo para “revelar a verdade”. Em seu discurso, através de metáforas, evidencia sua revolta e sua descrença em Deus. Ela o define de “poderoso ao contrário” e se julga mais sábia que Ele. “Que Deus é esse? Que Deus é esse que só fala de guerra e não sei o quê? Não é Ele que o próprio trocadilo? Só pra otário, pra esperto ao contrário, bobado, bestalhado. Quem já teve medo de dizer a verdade, largou de morrer? Largou? Quem andou com Deus dia e noite, noite e dia na boca ainda mais com os deboches, largou de morrer? Quem fez o que Ele mandou, o que o da quadrilha dele manda, largou de morrer? Largou de passar fome? Largou de miséria? Ah, não dá!”

O que é Deus na visão de Estamira? É aquele que, na existência, permite toda espécie de “trocadilhos”: o mal parecer bom, o feio parecer belo, o homem explorar o próprio homem, e assim por diante (não existe “homem inocente”, mas “esperto ao contrário”). “Sou ruim, mas não sou perversa.” Em várias passagens, Estamira se mostra revoltada com Deus e chega a dizer que seu ouvido não é privada diante da leitura que seu filho faz do Novo Testamento.

À morte ela dá sua própria definição: o “além dos além”, onde nenhum “sangüíneo pode ir lá”. “Sangüíneo”, para ela, é o homem em carne e osso, em formato, formato “homem par” e “homem ímpar”. Perturbada, diz que se comunica com “astros negativos”, espíritos “ruins” que tentam atordoá-la.


“O homem é o único condicional.”

O que se entende com a frase pronunciada inúmeras vezes por Estamira – “o homem é o único condicional” – é que o homem é o único responsável por tudo aquilo que lhe acontece. Não existe predestinação. Não existe Deus. Deus não acolhe o homem, não o ouve. “Piolho de terra suja que renegou os homens como o único condicional, mais revoltada eu fico.” A expressão “piolho de terra suja” significaria devoto?


“Sacrifício é uma coisa, agora, trabalhar é outra.”

Estamira demonstra fugir da realidade. Considera-se lúcida e vive em um mundo onde cria seus próprios conceitos, demonstrando certa sabedoria ao mesclá-los. Segundo ela, não vive para “fazer dinheiro”, não vive por isso. Porém, sem ter a clara noção de que muitas das vezes entra em contradição, diz não concordar com a vida.

Há 20 anos, Estamira sobrevive do que cata no aterro. Este é seu trabalho. Com chuva ou com sol, lá está ela a buscar sua subsistência, seu sustento para o corpo e para a alma. Tem sua atividade voltada para isso e não visa acumulação.

“Isso aqui é um disfarce de escravo. Escravo disfarçado de liberto, de libertado. Olha, a Izabel, ela soltou eles, né? E não deu emprego pros escravos; passam fome, comem qualquer coisa, igual aos animais e não têm educação.”


“Eu nunca tive aquilo que eu sou: sorte boa.”

A história de Estamira foi documentada pelo fotógrafo, e então diretor e produtor, Marcos Prado. Não se trata de um caso isolado. Estamira protagonizou no cinema uma história vivida por mais de centenas de brasileiros: o descaso. E aqui, não se refere apenas a quem viva no lixão, afinal, os direitos sociais elencados na Carta Magna são privilégios para poucos.


REFERÊNCIAS

PRADO, Marcos. Documentário Estamira. Ano: 2004.

Site oficial do documentário. www.estamira.com.br.













terça-feira, 21 de setembro de 2010

A obra de Max Weber

Artigo foi publicado no “Suplemento Literário” de 14 de abril de 1962
A inauguração do Instituto de Sociologia da Univeridade de Munique trouxe à tona o autor de ‘A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo’ e motivou a publicação, à época, do artigo de Carpeaux no Suplemento Literário de O Estado de São Paulo. 

Por Otto Maria Carpeaux

No Instituto de Sociologia da Universidade de Munique acaba de ser inaugurado o Arquivo Max Weber, em que, além de documentos e manuscritos, serão conservados os livros e estudos que se escreveram sobre o grande erudito: até agora, aproximadamente, 3.500.
Um orgão tão responsavel e tão insular como o
“Times Literary Supplement” chamou-o, há pouco, de “a maior figura da sociologia do seculo XX”.
Raymond Aron e Lorenzo Giusso dedicaram-lhe livros. O Fundo de Cultura Economica divulgou-lhe as obras no mundo de linguas ibericas. No Brasil, toda pessoa medianamente culta conhece o nome de Max Weber, pelo menos aqueles estudos que fundaram uma nova disciplina cientifica: estudando a influencia da ética protestante ou, mais exatamente, da ética calvinista sobre a formação da mentalidade capitalista, essa tese, embora muito discutida, é sua maior gloria e é o grande desmentido contra a idolatria da especialização: pois nunca teria nascido, se o economista e sociologo Weber, no ambiente estreito de uma cidadezinha universitaria alemã, não tivesse frequentado seus colegas da Faculdade de Teologia que ensinavam e estudavam a historia moderna da Igreja.
Mas tudo que Weber escreveu, continha germes e sugestões para outros estudos, de importancia muito grande, sempre maior do que aparentavam ser os assuntos. Seu primeiro trabalho, de 1891, sobre a historia da estrutura agraria do antigo Imperio Romano, esclareceu o papel historico do latifundio. Conquistou a catedra em Friburg com um estudo sobre a situação dos trabalhadores rurais na Alemanha oriental, então dominada pelos “junkers” prussianos. Combinou, em 1903, os dois assuntos, escrevendo um famoso verbete de enciclopedia sobre “Estrutura agraria na Antiguidade”, responsabilizando o latifundio pelo declinio e pela catastrofe da civilização antiga, terminando com uma sombria perspectiva para o futuro da Prussia latifundiaria de 1908. Também foi Weber o unico sociologo ocidental que se dignou de estudar a revolução russa de 1905: todo o mundo considerava-a então como a derrota de uma revolução socialista; mas o professor de Freiburg explicou-a como o fracasso de uma revolução burguesa, acreditando que esse fracasso causaria a transição direta da Russia, do feudalismo ao socialismo, sem fase burguesa.
Durante a primeira guerra mundial, entre 1914 e 1918, estendeu Weber seus estudos sobre sociologia da religião ao mundo não-cristão. Escreveu sobre religião e sociologia do Islão, da China e do judaismo; mas, sobretudo, os famosos artigos sobre Amos, Hosea, Isaías, Jeremias, os profetas do judaismo antigo. Até então, esses profetas eram considerados como individualistas religiosos, que libertaram o judaismo do monopolio dos sacerdotes do Templo, preparando a transformação da religião nacional dos hebreus em religião nacional dos hebreus em religião universal. Mas Weber demonstrou que os profetas não pensavam na salvação individual das almas, e, sim, na salvação da nação ameaçada. Lutaram contra a burocracia do templo e contra a monarquia, já de prestigio decadente, para que a nação sobrevivesse às suas instituições obsoletas. - Foram estas as ultimas pedras para o grandioso monumento científico que Weber deixou. Depois da catastrofe de 1918, já professor em Munique, dedicou-se, episodicamente, a atividades politicas, contribuindo para o estabelecimento do parlamentarismo na Republica de Weimar. A morte prematura, em 1920, poupou-lhe amargas decepções.
Ainda não se aludiu, nestas linhas, à idéia determinante de Weber, quase um princípio de filosofia da história moderna: esta é caracterizada pela progressiva racionalização de todos os setores da vida. O Estado e o pensamento politico, a Administração e a Justiça, o Direito e as teorias e praticas economicas libertam-se, há 5 ou mesmo 6 seculos, cada vez mais, de mitologias, filosofemas, tabus de toda a especie, para reconhecer como supremo criterio só a eficiencia: é a racionalização da vida ocidental. O mesmo “trend” verifica-se na evolução das ciencias, pela exclusão gradual dos julgamentos de valor, oriundos de preconceitos tradicionais ou de fonte emocional. O testamento de Weber são as duas grandes conferencias muniquenses de 1920, “Politica e profissão” e “Ciencia como profissão”, nas quais proclamou a objetividade total da ciencia e, portanto, sua independencia da politica que, por difinição, nunca pôde ser objetiva. Os valores, sendo elementos subjetivos, não devem entrar no estudo cientifico de problemas nem nos seus resultados. Mas Weber sabe que os valores subjetivos aceitos pelo estudioso têm determinada função psicologica: são eles que inspiram ao pesquisador a escolha dos seus temas. Têm função seletiva. Essa tese autoriza a pergunta seguinte: - quais foram os valores subjetivos que determinaram, para Max Weber, a seleção dos seus temas de estudo? Em toda a imensa bibliografia sobre o sociologo, só duas vezes - por Christoph Steding (1832) e por Wolfgang Mommsen (1959) - foi levantada aquela pergunta. Responderam, partindo de pontos de vista muito diferentes, chegando no entanto ao mesmo resultado: foram valores da vida politica; daquela politica que Weber quis tão radicalmente excluir da ciencia objetiva.
Filho da burguesia capitalista e industrial da Renania, e dedicando-se, como especialista, ao estado de problemas economicos, seria de supor-se que estes monopolizassem a atenção de Weber. Mas não aconteceu assim. Na mocidade recusou os mais vantajosos convites para entrar na direção de grandes trustes; mais, dos estudos especificamente economicos.
A inedita relação que Weber conseguiu estabelecer entre os ensinamentos morais do protestantismo calvinista e o estilo de vida do capitalismo, manda pensar em inspiração religiosa, talvez subconsciente; pois Weber era livre-pensador, descrente, mas filho de gerações de burgueses calvinistas. Mas a analise das suas reações revela logo que a inspiração não era de natureza religiosa e, sim, politica.
A burguesia calvinista renana, que tinha construido a grande industria da Alemanha ocidental é pequena minoria num país meio luterano e meio catolico. Seu destino foi o caso extremo do destino da burguesia alemã do seculo XIX em geral: ficou com liberdade para fazer seus grandes negocios, mas também ficou excluida da direção politica do país, confiada no rei da Prussia, quase absoluto, aos seus aristocratas prussianos, aos seus oficiais aristocraticos, à sua burocracia de juristas. Não foi possível organizar uma oposição eficiente. Os catolicos alemães, no seculo XIX, fecharam-se num “ghetto”, não querendo participar de uma civilização predominantemente protestante. O luteranismo retirou-se para a pequena burguesia e para o Leste agrario, pois a etica luterana paternalista, é incompativel com a grande industria e com a comercialização; o estudo da diferença essencial entre essa etica e a do calvinismo é mesmo um dos meritos de Weber e do seu amigo Troeltsch. O proletariado? Como filho da grande burguesia industrial, Weber se preocupa mais com os sofrimentos dos trabalhadores rurais do que com as esperanças dos trabalhadores urbanos. Seu grande trabalho sobre a influencia da etica calvinista na mentalidade capitalista é vigoroso desmentido ao materialismo historico que explicara, ao contrario, pelo capitalismo as mudanças da mentalidade religiosa; o proprio Weber definiu esse seu trabalho como exemplo de “antimarxismo positivo”; naturalmente num outro nivel do que a antimarxismo barato e ignorante dos maccarthystas de hoje. Weber só quis demonstrar que “o espirito é mais poderoso que a natureza” (inclusive as forças inconscientes da economia). Nesse sentido, o trabalho de Weber sobre etica calvinista e mentalidade capitalista é o ato pelo qual a burguesia alemã conquistou a consciencia das suas origens e do seu destino. Mas essa classe, rica, culta e consciente, estava excluida do poder pelo imperador Guilherme II e seus aristocratas e burocratas e os latifundiarios da Alemanha oriental.
Eis os “valores seletivos” que inspiraram a Max Weber seus temas de estudo. Seus trabalhos sobre o operariado rural da Alemanha oriental atingem diretamente o inimigo agrario, o “junker” prussiano. Os estudos, aparentemente historicos, sobre o declinio da civilização antiga e a derrota do Imperio Romano pela força autodestruidora do latifundio predizem desastre semelhante ao Imperio da aristocracia latifundiaria prussiana; são de natureza complementar os artigos sobre o fracasso da revolução russa de 1905. Enfim, a guerra de 1914 e a direção incompetente dessa guerra pelas classes dominantes da Alemanha confirmaram as previsões do sociologo.
Fiel à sua convicção de que “a ciencia (social) tem a função de fazer compreender fatos incomodos”, Weber começou a fazer oposição ao Kaiser. A censura não conseguiu impedir essa oposição. Nenhum evasionismo obrigou o sociologo a entrincheirar-se atrás de estudos historicos, cheios de alusões à atualidade. De sua livre vontade escolheu, durante os anos de guerra, o estudo dos profetas do judaismo antigo. Esses profetas lutaram contra uma monarquia impotente e contra os sacerdotes profissionais, especie de burocracia do Templo; assim como Weber lutou contra o imperador Guilherme II e sua burocracia administrativa e militar. Os profetas, conforme Weber, não se preocupavam com a salvação das almas individuais, mas da nação ameaçada. O sociologo também se preocupou, naqueles anos, só com o futuro da nação alemã em face da derrota iminente. Ao monarquismo decadente opôs a perspectiva de lideres saidos do povo e legitimados pela sua vocação, o “charisma”; e à burocracia opôs a reivindicação do regime parlamentarista, o regime proprio da burguesia, o triunfo da racionalização enfim também na politica.
Pela derrota de 1918, a monarquia foi abolida. A Republica de Weimar iniciou a experiencia parlamentarista. Weber morreu logo depois, em 1920. Não viveu, para assistir ao espectaculo de forças irracionalistas se apoderarem das suas esperanças. A preocupação exclusiva pelo futuro da nação virou nacionalismo fanatico. A substituição da monarquia pela liderança, “charismatica” degenerou em culto ao “Fuehrer”. O fim eram as ruinas da Alemanha destruida e depois, sua reconstrução meramente economica.
Mas - “o espirito é mais poderoso que a natureza”. Depois de tudo, a lição de Weber sobre a objetividade da ciencia venceu. Em meio das ruinas materiais do nazismo e das ruinas espirituais do “milagre economico” fica em pé o monumento de Max Weber: sua Obra.

domingo, 19 de setembro de 2010

O Indivíduo e a Sociedade

Sempre aprendemos que o meio e quem molda e ate define o destino dos indivíduos, que o homem e produto de meio, ou como diz Almeida Garret... o homem e ele e suas circunstanciais..., a maneira como Krishnamurti , enxerga o individuo e a sociedade, nos coloca em uma posição de contraposição a esta visão ocidental , que parece norteada pela filosofia hegeliana , que fora do estado o individuo não existe...então veremos como este pensador indiano define a sociedade e o individuo.
A vida em sociedade sempre e originaria de problemas, onde os indivíduos têm que ter a capacidade de administrar os conflitos próprios e os sociais, bem como saber lhe dar com as frustrações e sonhos. A grande questão e que o problema , dentro de uma sociedade sempre se renova, como os problemas são originados nos seres sociais e como todo ser social e transitório e mutável e lógico que os problemas dentro de uma sociedade também sejam moveis e se renovem a cada momento em um constante vim a Ser heracletiano, as crises , mesmo sendo colocadas de forma repetitivas , da ao individuo a idéia que e sempre a mesma , que e uma repetição..uma reinvenção incessante da roda...mas toda crise e nova e tem sua própria dinâmica..e só uma mente aberta e fresca e capaz de perceber o dinamismo das crises sociais.
O que podemos mencionar a partir desta colocação e que a sociedade e fruto das intenções internas são individuais de cada ser social, que os conflitos e lutas de cada Ser, e desencadeado e se desenrola no campo de batalha que se chama sociedade, a sociedade e fruto destes conflitos individuais, sem os conflitos e sonhos dos indivíduos qualquer sociedade esta fadada ao esquecimento ao fracasso. todos os grandes impérios quando alcançaram o Maximo que buscavam , quando as necessidades de seus SERES SOCIAIS, já estavam, plenamente satisfeita , onde os indivíduos não precisavam mais se preocuparem com sua sobrevivência , a sociedade se tornou estática e sem dinamismo social..levando estes grupos ao total esquecimento e destruição...podemos dizer que temos aqui um argumento plausível sobre a ascensão,apogeu e queda dos grandes grupos sociais. O que nos leva a outro ponto de vista, a sociedade não cria o individuo ou molda este, na verdade o comportamento do individuo e que molda uma sociedade, uma sociedade e fruto de comportamentos individuais, de sonhos decepções de seus indivíduos, por exemplo, a ascensão de Hitler ao poder na Alemanha, levou toda uma nação a se comportar mediante seu comportamento individual, um único homem, com seus sonhos, loucura e frustrações moldaram uma realidade social que encaixasse em seu sonho de poder, de sociedade, e ate de individuo, mas não só Hitler, a historia esta cheia de exemplos, Jesus, Maomé, Napoleão Bonaparte, Sócrates e Alexandre o grande, são exemplos de que o comportamento do individuo pode determinar o estado social de um grupo, ou ate mesmo de uma nação, como afirma Krisrnamurt, - O MUNDO E O QUE VOCE É – o mundo seria fruto de nossos próprios pensamentos, um individuo que seu interior e uma local de conflito, sofrimento e desesperança, não existe nenhum lugar na terra que fará ele enxergar um paraíso, ele reproduz no mundo exterior nada mais nada menos que seu mundo interior, antes de sermos afetado pela sociedade somos afetados por nos mesmo.
Sabemos sobre tudo que o homem vive em uma preocupação perpetua, dando razão ao pensador alemão, que pregava A VIDA E DOR E TEDIO- onde estamos apenas sobrevivendo neste inferno dantesco e não e difícil notar estas verdades , estamos sempre preocupados com nossas dividas , buscando adquirir mais conforto, mais amor, mais beleza, estamos sempre preocupados com nossas dividas, nosso trabalho, o que nos lança a um PRESENTE PERPETUO, não estamos vivendo no presente, mas estamos sempre vivendo ou no passado, ou no futuro, a sociedade de consumo que vivemos nos levou a esta loucura a este presente perpetuo, estamos sempre buscando algo que nunca iremos atingir principalmente nos que vivemos na era do avanço tecnológico, nunca teremos uma paz... Pois invertemos a lógica que por séculos moveu a humanidade, - APARECENDO A NESCESSIDADE SE CRIA O PRODUTO-, nos dias de hoje e o contrario – CRIE O PRODUTO E DEPOIS ESTIMULE O DESEJO, A NESCESSIDADE NÃO E IMPORTANTE- se olharmos em nossas casas veremos que 80% do que acumulamos foi fruto de nossa insatisfação temporária com nos mesmo.
Podemos nos perguntar e as sociedades socialistas que pregavam que todos os indivíduos devem ter seus desejos igualmente atendidos, por que não deram certo? Por um motivo simples, os socialistas poderiam entender muito bem de economia e política, mas não entediam nada de psicologia humana, pois desde que o mundo e mundo sabemos que o que move um grupo social e o que grande parte das religiões tentam apagar no ser humano, ou seja, o nosso traço de inveja,... Qualquer um que tiver um pouco de atenção com o comportamento humano vera que o que move a sociedade e a inveja, em qualquer grupo social a inveja e o motor de evolução, em uma igreja, no trabalho, no amor, no esporte, o que todos estão querendo? Chegar aonde o outro chegou, tomar o que o outro conquistou possuir um objeto melhor que o de seu oponente, obter uma perfeição estética melhor que o outro. Mas isto e importante em qualquer sociedade, sem a inveja o individuo se torna estático e sem vida, conseqüentemente a sociedade se torna apática e esta fadada ao fracasso, estimular a inveja nos indivíduos em um grau saudável e importante e fundamental para qualquer grupo social. pois sem a inveja os indivíduos deixam de ser criativos , deixam de buscar a suas próprias superações se dão por satisfeito com sua situação atual, a inveja e que leva o individuo a superar suas limitações, e que faz nascer sistemas políticos e ideológicos, religiosos e econômicos. O que acontece quando deixamos de ser criativos? A sociedade passa a ser formada por indivíduos copistas, passamos a copiar outros indivíduos que já copiaram de outros tantos, desta forma a originalidade morre a criatividade desaparece,pois ao copiar não somos nada nem ninguém este e um fenômeno que denominasse MIMETISMO, uma sociedade mimética em breve deixara de ser uma sociedade para ser apenas um aglomerado de pessoas... Mas vale ressaltar que uma pequena dose de imitação e importante quando se trata de pequenos grupos sociais, por exemplo, à família, formamos nosso caráter nossos valores imitando os membros de nossa família, um grupo religioso só tem coerção devido o fenômeno mimético, o que prova que o mimetismo só e fatalistico para a grande sociedade, mas e fundamental aos pequenos grupos sociais.
A grande característica das sociedades miméticas e a velocidade que as crises surgem, o homem moderno cria o problema e depois se pergunta o que fazer com ele, por exemplo, criamos o automóvel, nos tornamos homens sapiens motorizados, e não paramos para pensar que ao ver um individuo andar de carro o outro também quis, e o próximo também se achou no direito de ter um automóvel, e o mimetismo foi sendo reproduzido socialmente, agora estamos diante dos problemas ambientais provocado em parte pela queima dos combustíveis fosseis, e não sabemos como resolver esta crise. O problema e que nossas ações diante de uma crise e determinada pela nossa ideologia, pelas nossas crenças, um homem que foi criado dentro dos valores materialistas economicista, não estará preocupado com a questão ambiental, ai esta a prova que o individuo age sobre a sociedade, que o eu do individuo em certas questões e mais forte que o eu da sociedade, milhares de seres humanos são reféns do desejo e dos conflitos e desejos de um pequeno grupo de homens animais. Esta realidade nos leva a uma questão fundamental, -POR QUE EXISTE DINSTIÇAO DE HOMEM –HOMEM? Por que sou alemão, e ele italiano? Por que sou europeu e ele africano? Por que nos fomos os únicos animais que criamos distinções entre nos mesmo? Esta divisão e que tem levado o homem a guerras e mortes, pois se sou europeu ou norte americano tenho o direito divino de poluir de conquistar de fazer matanças legalizadas, mas se sou sul americano ou africano tem o direito divino de aceitar os desígnios dos escolhidos de Deus. A sociedade esta cega , estes valores ideológicos são errados , são inexistentes, pois um individuo maduro e de mente aberta percebera que antes de todos estes títulos devemos respeitar o titulo de SER HUMANO, americano, brasileiro , católico, mulçumano, judeu ou árabe, são apenas títulos ideológicos que tem levado o homem a guerras e mortes , precisamos repensar esta divisão de homem – homem, como dizia o poeta, - ou aprendemos a viver todos como irmão ou morreremos todos juntos como animais- a divisão leva a conflitos.
As questões levantadas no texto nos levam a perguntar será que o individuo e mesmo determinante na sociedade? Sim podemos dizer que sim, o grande problema e que os indivíduos vivem no campo do IDEAL e esquecem de viver no campo do REAL, nossa realidade só pode ser alterada quando tomamos consciência de nossa vida verdadeira, quando criamos um dialogo com nos mesmo, quando temos o que Sócrates chamou de auto-cuidado, quando nos tornamos responsáveis por nos mesmo quando assumimos o destino de nossas vidas em nossa própria mão, quando somos capazes de pensar por nos mesmo, e não pensar a partir do pensamento de outro individuo, lideres são importante em uma sociedade, mas ó líder mais importante somos nos mesmos, só quando obtemos vitórias sobre nos mesmo e que somos grandes e que somos heróis. O inicio e o fim esta em nos mesmo, busca coisas e sentimentos fora , nos leva a ilusão, a solidão e ao sofrimento.
BIBLIOGRAFIA
Palestra de Krishnamurti realizada em Ojai, Califórnia, EUA, 1944 )

Liberdade?

De uma forma geral, a palavra "liberdade" significa a condição de um indivíduo não ser submetido ao domínio de outro e, por isso, ter pleno poder sobre si mesmo e sobre seus atos.
O desejo de liberdade é um sentimento profundamente arraigado no ser humano. Situações como: a escolha da profissão, o casamento e o compromisso político ou religioso, fazem o homem enfrentar a si mesmo e exigem dele uma decisão responsável quanto a seu próprio futuro.
Mas até qual ponto vai nossa liberdade? estamos submisos a nossa cultura, entrelaçados em paradigmas culturais que ditam nossa forma de pensar.
Do ponto de vista legal, o indivíduo é livre quando a sociedade não lhe impõe nenhum limite injusto, desnecessário ou absurdo. Uma sociedade livre dá condições para que seus membros desfrutem, igualmente, da mesma liberdade. Em 1948, a Assembléia Geral das Nações Unidas adotou a Declaração Universal dos Direitos Humanos, que engloba os direitos e liberdade que a Organização das Nações Unidas (ONU) considera que devam ser os objetivos de todas as nações.
A capacidade de raciocinar e de valorizar de forma inteligente o mundo que o rodeia, é o que confere ao homem o sentido da liberdade entendida como plena expressão da vontade humana.
Teorias filosóficas e políticas, de todos os tempos, tentaram definir liberdade quanto a determinações de tipo biológico, psicológico, econômico, social etc. As concepções sobre essas determinações, nas diversas culturas e épocas históricas, tornam difícil definir com precisão a idéia de liberdade de uma forma generalizada.
Muitas vezes temos a vontade de expressar algum tipo de opinião, a qual muitas vezes é mal vista por outras pessoas ou simplesmente temos medo de divulgá-la pois não sabemos exatamente o que podemos falar e nos portar perante algumas situações as quais dividem muitas opiniões, assim temos medo de que tenhamos algum tipo de repreensão por causa de algum tipo de argumento transmitido.
Numa concepção mais radical a liberdade seria uma ilusão? se a condição literal da palavra liberdade é não ser submetido ao domínio de outro, isso seria na verdade uma útopia, já que somos seres em constante aprendizado, aprendendo sob a ideia de terceiros influenciados pelas mesmas, levando em conta o meio cultural no qual vivemos ditando a forma "nomal" de pensar, vestir, comer, agir etc. Então onde esta a liberdade ?

Análise de “A Náusea”, de Jean Paul Sartre

Introdução

Em "A Náusea", Sartre nos mostra Antoine Roquentin, um historiador letrado e viajado, que chega à cidade de Bouville ("boul" indicando "lama" e metaforicamente "impureza") a fim de escrever a biografia do marquês de Rollebon, figura pitoresca e de excentricidade fascinante, que vivera na cidade durante o século XVIII. Ao iniciar seus trabalhos, logo se desencanta de forma irreversível não só pela biografia, como também pela própria sociedade e condições humanas com as quais se depara em Bouville. Roquentin é, então, acometido por uma (a priori) estranha sensação de aversão ao ser humano e sua condição existencial - a "náusea". Cercada de um niilismo exacerbado e elucubrações de alta profundidade intelectual, "A Náusea" nos mostra um protagonista despadronizado e repelido pelas próprias contestações que faz a respeito da existência e sua falta de sentido, ou seja, a respeito da gratuidade e ilogicidade da existência, por si só desprovida de essência. Trata-se, portanto, da saga de um personagem conturbado e por vezes beirando a loucura, tal é a nudez existencial a que ele se expõe.

Mecanismos de busca essencial

Como dito, para Antoine Roquentin a existência é gratuita e ilógica e essa constatação por cada um de nós é algo terrível e fora de aceitabilidade. Decorre dessa falta de essência verdadeira uma busca de cada ser humano por sua essência artificial e iludida, havendo, para esse fim, uma série de mecanismos que tornam a existência mais suportável.
Um desses mecanismos próprios de cada um é o que ele chama de "captura do tempo". Trata-se de uma organização memorial para tornar pequenos fatos, simples existências, marcos de um sentimento aventureiro, fazendo desse "grande" fato um polarizador atrativo dos fatos precedentes, como se esses tivessem levado ao grande fim. Dessa forma, organiza-se a memória humana a partir de fins, na ordem inversa. Esse mecanismo é apontado por Roquentin como uma poderosa instrumentação da mentira, a qual ele mesmo usou sem se dar conta, num ato involuntário de sua própria condição de homem.

Outro mecanismo elucidado pelo protagonista é o mundo do conhecimento e das ciências, criado pelas "grandes mentes" ainda presas em sua busca essencial. Esse mundo, que trata da origem das espécies, da conservação da energia no universo e chega a conferir uma essência "preguiçosa" até às janelas, "com seu índice de refração", é ilusório e torna o ser humano um conhecedor de seu mundo, um dominador de si mesmo e dos outros, num processo de profunda ilusão. Fazendo uma analogia à alegoria da caverna, de Platão, o homem imagina-se conhecedor de todo um universo, enquanto, na verdade, busca conhecer minuciosamente cada parte (por menor que seja) de sua caverna, sem jamais vislumbrar seu exterior. É mais um engano, sadio para a manutenção da existência.
Um outro mecanismo apontado é o de ordenamento das glórias passadistas pela burguesia acrítica e inábil para a contestação meditativa. Assim, glórias de outras gerações, baseadas no capital e no valor epidérmico do mundo, são relembradas de forma a conferir uma essência, uma lógica, à existência dos burgueses do presente. Esse mecanismo detestável a Roquentin lhe rouba críticas muito contundentes, chamando de "salafrários" a todos os burgueses de Bouville, constituintes desse espécime humano alienado.

Dialogando com Descartes

Da célebre frase "Penso, logo existo", Sartre, pela voz de Antoine Roquentin, faz um aprofundamento filosófico bem à maneira do Existencialismo, do qual Sartre é figura proeminente. Assim, para o protagonista, a consciência da existência, o sentir-se existir, advém do fato do pensamento, ou seja, à medida que se pensa, sente-se existir. Essa consciência é algo horrível para Roquentin e torna-se ainda pior quando ele constata que a única forma para fugir à existência é fugir ao pensamento. Mas nos perguntamos: como fugir ao pensamento se a necessidade de fuga já é um pensamento, que, como qualquer outro, nos reconduz à existência? Estamos presos, portanto, à existência, pois o caminho do pensamento e a chegada ao sentimento de existir são indesvencilháveis. Eis aí uma bela explicação à referida "náusea", que intitula a obra, pois quem suportaria estar perfeitamente cônscio de sua prisão sem, ao menos, sentir-se "nauseado"?

Humanismo x Existencialismo


Uma das únicas personagens com quem Antoine Roquentin se relaciona no livro é o Autodidata, um humanista ferrenho que aprendeu grande parte de seu vário conhecimento nos livros da biblioteca municipal, onde trabalha. De orientação filosófica bastante adversa à de Roquentin, ele representa uma personificação do Humanismo. Resulta dos encontros dos dois na biblioteca uma série de discussões de alta profundidade intelectual, num gládio de alto nível entre as duas posturas - a do Humanismo (representada pelo Autodidata, credor das capacidades humanas diferenciais) e a do Existencialismo (representada por Roquentin, niilista, misantrópica e repleta de meditações pessimistas). Após discussões severas, o protagonista Roquentin chega, entretanto, à conclusão de que não vale mais a pena discutir, pois a mente do Autodidata definitivamente não está preparada nem disposta a ouvir seus intricados conceitos, os quais seriam a perdição absoluta de qualquer humanista. Um episódio bastante interessante a ser citado e que ocorre durante um dos encontros dos dois na biblioteca municipal é a morte de uma mosca, esmagada por Roquentin em frente ao Autodidata. Ignorando os pedidos do bibliotecário, Roquentin esmaga a mosca e declara consternado: "Simplesmente libertei-a de sua existência, era um favor a prestar a ela!". É, sem dúvida, um episódio que deixa bem clara a melancolia advinda do existencialismo sartriano.

Música e Existencialismo

Logo no início da obra, Roquentin é bruscamente retirado de sua incessante náusea por uma composição jazzística de nome "Some of These Days". A princípio, essa correlação entre alívio e música é bastante misteriosa para o protagonista, mas, aos poucos, ele acaba por entender sua razão. Depois, analisando a atitude daqueles que ele chama de "imbecis", ou seja, aqueles que vão às salas de concertos buscando o esquecimento dos problemas ou aqueles que buscam superar suas crises com os "Prelúdios de Chopin", Roquentin conclui que essas pessoas tentam se deixar tocar pela música, como se essa fosse capaz de penetrar os poros do corpo e os vazios da mente, provocando uma mudança de sensações. Na verdade, isso pode ser apontado como mais um mecanismo de esquiva da existência penosa e intratável, de forma que, ao invés de sofrer pura e simplesmente, cada ser humano busca um sofrimento ritmado, melódico, ou como o próprio Roquentin infere: "É preciso sofrer em compasso". Ele vê-se, portanto, inserido nesse contexto de humanidade, tendo sofrido do mesmo engano que qualquer outro ser humano sofre, ao deixar-se invadir pela música tantas vezes citada "Some of These Days".

A verdadeira existência

Ao final da obra, após ter reencontrado sua mulher Anny, pela qual ainda pensava nutrir fortes sentimentos, Antoine Roquentin descobre que já não havia entre eles mais nada, exceto a simples repugnância entre quaisquer duas existências, o que o abala extremamente e o leva e abandonar Bouville definitivamente. Antes de partir, entretanto, ele termina por fazer suas reflexões mais escaldantes de toda a obra. Usando de sua ampla visão e conhecimentos, ele divaga sobre o que é a existência definitiva e as relações entre as existências simplórias que encontramos por toda parte, sempre à espreita.
Para ele, por exemplo, a idéia da existência de uma árvore passa a ser gratuita e absurda como qualquer outra existência e o absurdo reside no próprio fato de se existir, isto é, torna-se um absurdo à medida que se existe, pois a existência é desprovida de uma lógica que a fundamente. Já no campo da matemática, uma circunferência encontra em si mesma uma lógica definida e clara - o giro completo de um segmento de reta lhe confere seu fundamento. Logo, o que existe é absurdo exatamente pelo fato de existir e deixa-se o absurdo à medida que se deixa a existência. Também o tempo é visto de uma forma intrigante, sendo nada mais nada menos que a nossa percepção sensitiva da mudança entre duas existências. O tempo, pouco conceituável fisicamente, torna-se filosoficamente algo de simplicidade interessante - entre duas existências e uma observação externa, configura-se a noção de tempo.
Para selar o pessimismo que é detonado a cada página, Roquentin diz ainda que, algum dia, ele vai esbarrar nas ruas com homens cujas línguas estejam transformadas em lacraias e suas feições completamente animalizadas, pois, em sua visão, a igualdade de todas as existências poderia tornar os homens cada vez mais "existentes", simplesmente "existentes", como as próprias lacraias o são. O marquês de Rollebon, origem de sua vinda a Bouville, tornara-se, para ele, uma simples fuga de si mesmo, um homem buscando abandonar sua existência e mergulhar na de outro, numa tentativa naturalmente frustrada. Uma das últimas coisas que ele faz em Bouville, antes de tomar seu trem, é sentar-se num banco e observar as existências que o rodeiam, seja a de um lago, a de uma árvore ou a de cada pessoa que ele observa.
Devemos ter em vista, ainda, que "A Náusea" é uma obra que cresceu numa mente inquieta e repleta de conceitos complicadíssimos e, até certo ponto, chocantes - a mente de Sartre. Cresceu também num solo fértil para tais contestações existenciais - um palco beligerante que encaminhava a Segunda Guerra Mundial (iniciada em 1939, um ano após a publicação da obra). Inegavelmente, a obra traz conceitos revolucionários e dissonantes de qualquer forma filosófica precedente, sendo amada por uns e renegada por outros, sem, todavia, perder sua importância no cenário da filosofia do século XX.
 Autor:  Marcelo Sobrinho Mendonça

CIÊNCIA E SENSO COMUM ?

  O que é psicologia do senso comum?
  Usamos o termo psicologia, no nosso cotidiano, com vários sentidos, como por exemplo, quando falamos do poder de persuasão ou de compreensão de alguém ou da capacidade que algumas pessoas têm de escutar os outros e darem bons conselhos. Essa psicologia, usada no dia-a-dia pelas pessoas, é chamada de psicologia do senso comum.

O SENSO COMUM: CONHECIMENTO DA REALIDADE

  Durante nossa vida cotidiana vamos adquirindo várias aprendizagens, pela via do hábito e da tradição, que passam de geração para geração. Assim, aprendemos com nossos pais a atravessar a rua, a fazer a televisão funcionar, a plantar alimentos na época e de maneira correta. Com nossos amigos e colegas aprendemos a paquerar, a ficar ou a pedir para namorar a pessoa que desejamos, a nos comportarmos em sala de aula, no trabalho, e assim por diante.
  Na vida cotidiana, as teorias científicas são simplificadas, quer seja para viabilizar seu uso no dia-a-dia, quer seja pela interpretação sempre singular dos fatos vividos, que muitas vezes parecem contradizer as considerações feitas pela ciência. É justamente o conhecimento que vamos acumulando no nosso dia-a-dia que é chamado de senso comum. O senso comum mistura e recicla saberes muito mais especializados e os reduz a um tipo de teoria simplificada, produzindo uma determinada visão-de-mundo.
  O senso comum vai integrando, ainda que de um modo precário, todo o conhecimento humano, produzindo para cada pessoa ou grupo social um modo particular de interpretar os fatos e o mundo que o cerca. Sem esse conhecimento intuitivo, espontâneo, construído muitas vezes de tentativas e erros, a nossa vida no dia-a-dia seria muito complicada. E é na tentativa de facilitar o dia-a-dia que o senso comum produz suas próprias "teorias" médicas, físicas, psicológicas etc.

  O que é ciência?
  A ciência é uma atividade reflexiva, que procura compreender, elucidar e alterar o cotidiano a partir de um estudo sistemático e não simplesmente da adaptação à realidade. Quando fazemos ciência, afastamo-nos da realidade para compreendê-la melhor, transformando-a em objeto de investigação - o que permite a construção do conhecimento científico sobre o real.
  A ciência é composta de um conjunto de conhecimentos sobre fatos ou aspectos da realidade (objeto de estudo), expresso por meio de uma linguagem precisa e rigorosa. Esses conhecimentos devem ser obtidos de maneira programada, sistemática e controlada, para que se permita a verificação de sua validade.
  A ciência tem ainda uma característica fundamental: ela aspira à objetividade. Suas conclusões devem ser passíveis de verificação e isentas de emoção (isto é, busca-se atingir a neutralidade), para, assim, tornarem-se válidas para todos, ou seja, poderem ser generalizadas em todas as situações.
  Objeto específico, linguagem rigorosa, métodos e técnicas específicos, processo cumulativo do conhecimento e objetividade fazem da ciência uma forma de conhecimento que supera em muito o conhecimento espontâneo do senso comum. Esse conjunto de características é o que permite denominarmos um conjunto de conhecimentos de científico.
   
  O objeto de estudo da Psicologia
  Como dissemos acima, para ser considerado científico, um conhecimento precisa ter um objeto específico de estudo. Assim, por exemplo, o objeto da astronomia são os astros e o da biologia são os seres vivos. Tal classificação aponta para a possibilidade de se isolar o objeto de estudo, tornando-o distante da nossa realidade cotidiana e estabelecendo com ele a neutralidade e objetividade desejadas.
  Entretanto, o mesmo não ocorre com a Psicologia, que, como a Antropologia, a Economia, a Sociologia e outras ciências humanas, estuda o homem. Estamos diante, portanto, de uma dificuldade comum a todas as ciências humanas: separar o objeto de estudo e o sujeito que o examina. Por outro lado, dizer que a psicologia estuda o homem é conceituá-la de um modo abrangente demais e apenas coloca a Psicologia entre as outras ciências humanas.
  Na verdade, estamos aqui diante de um problema fundamental para a psicologia: na psicologia, o homem é visto de maneiras bem diversas entre si. A diversidade de objetos da psicologia é explicada, principalmente, por dois fatores. Em primeiro lugar, este campo do conhecimento constituiu-se como área do conhecimento científico só muito recentemente. Até o fim do século XIX apenas a filosofia e a teologia preocupavam-se com esse objeto.
  Um segundo motivo que contribui para dificultar a clara definição de objeto em Psicologia é o fato de o cientista - o pesquisador - confundir-se, nessa disciplina, com o objeto a ser pesquisado. No sentido mais amplo, o objeto de estudo da Psicologia é o homem, e neste caso o pesquisador está inserido na categoria a ser estudada. Assim, a concepção de homem que o pesquisador traz consigo "contamina" inevitavelmente a sua pesquisa em Psicologia. Isso ocorre porque há diferentes concepções de homem entre os cientistas (na medida em que estudos filosóficos e teológicos e mesmo doutrinas políticas acabam definindo o homem à sua maneira, e o cientista acaba necessariamente se vinculando a uma destas crenças).
  Na realidade, este é um "problema" enfrentado por todas as ciências humanas, muito discutido pelos cientistas de cada área e até agora sem perspectiva de solução. Assim, a Psicologia hoje se caracteriza por uma diversidade de objetos de estudo. Esta situação leva-nos a questionar a caracterização da Psicologia como ciência e a postular que no momento não existe uma psicologia, mas Ciências Psicológicas embrionárias e em desenvolvimento.

  A subjetividade como objeto da Psicologia
  Considerando toda essa dificuldade na conceituação única do objeto de estudo da psicologia, preferimos apresentar a você uma definição que sirva como referência para nossas próximas aulas, uma vez que você irá se deparar com diversos enfoques – diversas escolas de psicologia - que trazem definições específicas desse objeto: o comportamento, o inconsciente, a consciência etc.
  A identidade da psicologia é o que a diferencia dos demais ramos das ciências humanas, e pode ser obtida considerando-se que cada um desses ramos enfoca o homem de maneira particular. Assim, cada especialidade - a economia, a política, a história etc. trabalha essa matéria-prima de maneira particular, construindo conhecimentos distintos e específicos a respeito dela. A psicologia colabora com o estudo da subjetividade: é essa a sua forma particular específica de contribuição para a compreensão da totalidade da vida humana.
  A subjetividade é a síntese singular e individual que cada um de nós vai constituindo conforme vamos nos desenvolvendo e vivenciando as experiências da vida social e cultural; é uma síntese que nos singulariza, de um lado, por ser única, e nos iguala, de outro lado, na medida em que os elementos que a constituem são experienciados no campo comum da objetividade social. Esta síntese - a subjetividade - é o mundo de idéias, significados e emoções, construído internamente pelo sujeito partir de suas relações sociais, de suas vivências e de sua constituição biológica; é, também, fonte de suas manifestações afetivas e comportamentais.
  Importa muito ressaltar aqui que a subjetividade não só é fabricada, produzida, moldada pelo campo da cultura, pelos pais, amigos, colegas e grupos. Vale dizer que ela é também automoldável, ou seja, o homem pode promover novas formas de subjetividade, recusando-se ao assujeitamento e à perda de memória imposta pela fugacidade da informação; recusando a massificação que exclui e estigmatiza o diferente, a aceitação social condicionada ao consumo, a medicalização do sofrimento. Nesse sentido, retomamos a utopia que cada homem pode participar da construção do seu destino e de sua coletividade.

  A Psicologia e o Misticismo
  A Psicologia, como área da Ciência, vem se desenvolvendo na história desde 1875, quando Wilhelm Wundt (1832-1926) criou o primeiro Laboratório de Experimentos em Psicofisiologia, em Leipzig, na Alemanha. Esse marco histórico significou o desligamento da psicologia da filosofia e da religião, com suas idéias abstratas e espiritualistas que defendiam a existência de uma alma nos homens, como a morada da vida psíquica. A partir deste marco histórico, a história da Psicologia fortalece seu vínculo com os princípios e métodos científicos. A idéia de um homem autônomo, capaz de se responsabilizar pelo seu próprio desenvolvimento e pela sua vida, também vai se fortalecendo a partir desse momento.
  Hoje, a Psicologia ainda não consegue explicar muitas coisas sobre o homem. A invenção dos computadores, por exemplo, trouxe e trará mudanças em nossas formas de pensamento, em nossa inteligência, e a Psicologia precisará absorver essas transformações em seu quadro teórico.
Alguns dos "desconhecimentos" da Psicologia têm levado os psicólogos a buscarem respostas em outros campos do saber humano. Com isso, algumas práticas não-psicológicas têm sido associadas às práticas psicológicas. O tarô, a astrologia, a quiromancia, a numerologia, entre outras práticas adivinhatórias e/ou místicas, têm sido associadas ao fazer e ao saber psicológico.
  Vale, entretanto, ressaltar que estas não são práticas da psicologia. São outras formas de saber sobre o humano que não podem ser confundidas com a Psicologia, pois não são construídas no campo da Ciência, a partir do método e dos princípios científicos, além de estarem em oposição aos princípios da Psicologia, que vê o homem como ser autônomo. As práticas místicas têm pressupostos opostos, pois nelas há a concepção de destino, da existência de forças que não estão no campo do humano e do mundo material.
  A Psicologia, ao relacionar-se com esses saberes, deve ser capaz de enfrentá-los sem preconceitos, reconhecendo que o homem construiu muitos "saberes" em busca de sua felicidade. Mas é preciso demarcar nossos campos. Esses saberes não estão no campo da Psicologia, mas podem se tornar seu objeto de estudo.
   Diferenciando áreas do conhecimento
   Um questionamento realizado nos últimos períodos, com cerca de 300 alunos de Marketing da UniverCidade, indicou que apenas um percentual insignificante dos alunos sabe discernir com clareza as diferenças entre psiquiatria, psicologia e psicanálise, apontando para uma variedade de interpretações de senso comum a que estão sujeitos os assuntos que envolvem os aspectos psicológicos. Por isso, achamos por bem clarificar o campo de ação dos três campos.
Psiquiatria - A psiquiatria é uma especialização da medicina voltada ao tratamento dos transtornos mentais causados por um funcionamento inadequado do cérebro. De fato, existem evidências exaustivas de que existem correlações entre diversos distúrbios de comportamento e afetações dos mecanismos cerebrais. O psiquiatra é, portanto, um médico que estará estudando as inter-relações entre as funções orgânicas e psíquicas e buscará cessar os sintomas decorrentes das disfunções através do uso de medicamentos adequados a este fim.
Psicologia - A psicologia, como vimos, é o conjunto de ciências que estuda a pessoa através de seu comportamento ou dos processos mentais, relacionando-os a fatores sócio-culturais e /ou estruturais. Ela foca, principalmente, o funcionamento dos indivíduos e grupos, visando sua melhor condição de interação com o mundo. Podemos dizer que sua ética se dirige para a busca do bem-estar ou da felicidade possível dos/entre os homens, vinculada à vontade do eu ou ao controle dos comportamentos.
Psicanálise - A psicanálise, fundada por Sigmund Freud, é um método de investigação do psiquismo humano que busca evidenciar o significado inconsciente das palavras, ações e produções imaginárias de um sujeito (Laplanche e Pontalis, 57:384), bem como investigar os conflitos psíquicos resultantes das intensidades que atravessam o sujeito e que se opõem aos limites sócio-culturais por ele internalizados. Ela dá um golpe no narcisismo da humanidade ao revelar que o eu – investido pela psicologia - não é o Senhor em sua própria casa, além de enunciar uma sexualidade em ruptura com instintos e impulsos naturais. Através da escuta, o psicanalista pretende auxiliar o paciente na busca de um maior conhecimento dos desejos que o atravessam, de sua constituição como diferença e singularidade, através de um instrumento terapêutico essencial: a palavra.


Leitura Complementar

A PSICOLOGIA DOS PSICÓLOGOS
“(...) somos obrigados a renunciar à pretensão de determinar para as múltiplas investigações psicológicas um objeto (um campo de fatos) unitário e coerente. Conseqüentemente, e por sólidas razões, não somente históricas mas doutrinárias, torna-se impossível à Psicologia assegurar-se uma unidade metodológica. (...)
Por isso, talvez fosse preferível falarmos, ao invés de "psicologia", em "ciências psicológicas". Porque os adjetivos que acompanham o termo "psicologia" podem especificar, ao mesmo tempo, tanto um domínio de pesquisa (psicologia diferencial), um estilo metodológico (psicologia clínica), um campo de práticas sociais (orientação,reeducação, terapia de distúrbios comportamentais etc.), quanto determinada escola de pensamento que chega a definir, para seu próprio uso, tanto sua problemática quanto seus conceitos e instrumentos de pesquisa. (...) não devemos estranhar que a unidade da Psicologia, hoje, nada mais seja que uma expressão cômoda, a expressão de um pacifismo ao mesmo tempo prático e enganador. Donde não haver nenhum inconveniente em falarmos de "psicologias' no plural. Numa época de mutação acelerada como a nossa, a Psicologia se situa no imenso domínio das ciências ”exatas", biológicas, naturais e humanas. Há diversidade de domínio e diversidade de métodos. Uma coisa, porém, precisa ficar clara: os problemas psicológicos não são feitos para os métodos; os métodos é que são feitos para os problemas. (...)

  Interessa-nos indicar uma razão central pela qual a Psicologia se reparte em tantas tendências ou escolas: a tendência organicista, a tendência fisicalista, a tendência psico-sociológica, a tendência psicanalítica etc. Qual o obstáculo supremo impedindo que todas essas tendências continuem a constituir "escolas" cada vez mais fechadas, a ponto de desagregarem a outrora chamada "ciência psicológica"? A meu ver, esse obstáculo é devido ao fato de nenhum cientista, conseqüentemente, nenhum psicólogo, poder considerar-se um cientista "puro". Como qualquer cientista, todo psicólogo está comprometido com uma posição filosófica ou ideológica. Este fato tem uma importância fundamental nos problemas estudados pela Psicologia. Esta não é a mesma em todos os países. Depende dos meios culturais. Suas variações dependem da diversidade das escolas e das ideologias. Os problemas psicológicos se diversificam segundo as correntes ideológicas ou filosóficas venham reforçar esta ou aquela orientação na pesquisa, consigam ocultar ou impedir este ou aquele aspecto dos domínios a serem explorados ou consigam esterilizar esta ou aquela pesquisa, opondo-se implícita ou explicitamente a seu desenvolvimento.”


Hilton Japiassu. A psicologia dos psicólogos.
2.ed. Rio de Janeiro, lmago, 1983. p. 24-6









Adaptação do cap. 1 de Bock, A. M. B.et all.,
Psicologias – uma introdução ao estudo da psicologia,
São Paulo, Ed. Saraiva, 1999.

     

Mito da caverna

 Mensagem bastante interesante no qual escolhi para abrir a primeira postagem do meu blog. Muito boa para refletir, a autoria desta mensagem é de Ale

Todos os dias travamos uma série de relações com outras pessoas e com as coisas do mundo. Lidamos com coisas das quais gostamos, das quais não gostamos; perguntamos pelas horas, pela data; dizemos ser verdade o que acabamos de dizer, nos equivocamos, mentimos etc. Em geral, para nada disso precisamos pensar, ou seja, realizamos todas essas tarefas automaticamente. Já sabemos de antemão do que gostar, como medir o tempo, distinguir a verdade da mentira, reconhecer um erro, quando e por que optar por mentir etc. Tudo isso aprendemos no decorrer de nossa educação. Herdamos essas informações de nossa cultura. Nossos pais, nossos amigos, ou seja, a sociedade em que vivemos, nos ensina como agir cotidianamente. Estamos mergulhados numa rede de significações, e isso se chama bom senso. Esse mergulho cego é necessário para nos comunicarmos. Os pertencentes a certa comunidade compartilham da mesma rede de significações, por isso se entendem. Essa relação com o mundo é imediata e é a comum para todos nós na grande maioria das vezes. Lidamos, portanto, com o entendimento das coisas e pessoas em geral de modo passivo. Não estabelecemos uma investigação profunda das características morais e psíquicas de alguém para somente aí dizermos se gostamos ou não da pessoa, assim como não questionamos a todo momento o que realmente significa todas as crenças presentes em nossas conversas cotidianas para então conversarmos. Não obstante, se por algum motivo começamos a perceber ou desconfiar de que "as coisas" não são bem assim, ficamos mas atentos, contemplativos, a espera de descobrir algo que não se sabe ainda o que é. Essa "desconfiança" de que há algo errado ou, pelo menos, estranho em tudo o que vemos representa uma crise no modo de entendermos as coisas. O referido mergulho na rede de significações cotidianas e a crise resultante do colocar em questão essa mesma rede são muito bem ilustrados pelo mito da caverna de Platão:

  Trata-se de um diálogo metafórico onde as falas na primeira pessoa são de Sócrates, e seus interlocutores, Glauco e Adimato, são os irmãos mais novos de Platão. No diálogo, é dada ênfase ao processo de conhecimento, mostrando a visão de mundo do ignorante, que vive de senso comum, e do filósofo, na sua empreitada rumo à verdade.

  Mito da Caverna (resumo)

  Imaginemos uma caverna subterrânea onde, desde a infância, geração após geração, seres humanos estão aprisionados. Suas pernas e seus pescoços estão algemados de tal modo que são forçados a permanecer sempre no mesmo lugar e a olhar apenas para frente, não podendo girar a cabeça nem para trás nem para os lados. A entrada da caverna permite que alguma luz exterior ali penetre, de modo que se possa, na semi-obscuridade, enxergar o que se passa no interior. A luz que ali entra provém de uma imensa e alta fogueira externa. Entre ela e os prisioneiros - no exterior, portanto - há um caminho ascendente ao longo do qual foi erguida uma mureta, como se fosse a parte fronteira de um palco de marionetes. Ao longo dessa mureta-palco, homens transportam estatuetas de todo tipo, com figuras de seres humanos, animais e todas as coisas.
  Por causa da luz da fogueira e da posição ocupada por ela, os prisioneiros enxergam na parede do fundo da caverna as sombras das estatuetas transportadas, mas sem poderem ver as próprias estatuetas, nem os homens que as transportam. Como jamais viram outra coisa, os prisioneiros imaginam que as sombras vistas são as próprias coisas. Ou seja, não podem saber que são sombras, nem podem saber que são imagens (estatuetas de coisas), nem que há outros seres humanos reais fora da caverna. Também não podem saber que enxergam porque há a fogueira e a luz no exterior e imaginam que toda luminosidade possível é a que reina na caverna. Que aconteceria, indaga Platão, se alguém libertasse os prisioneiros? Que faria um prisioneiro libertado? Em primeiro lugar, olharia toda a caverna, veria os outros seres humanos, a mureta, as estatuetas e a fogueira. Embora dolorido pelos anos de imobilidade, começaria a caminhar, dirigi ndo-se à entrada da caverna e, deparando com o caminho ascendente, nele adentraria. Num primeiro momento, ficaria completamente cego, pois a fogueira na verdade é a luz do sol e ele ficaria inteiramente ofuscado por ela. Depois, acostumando-se com a claridade, veria os homens que transportam as estatuetas e, prosseguindo no caminho, enxergaria as próprias coisas, descobrindo que, durante toda sua vida, não vira senão sombras de imagens (as sombras das estatuetas projetadas no fundo da caverna) e que somente agora está contemplando a própria realidade. Libertado e conhecedor do mundo, o prisioneiro regressaria à caverna, ficaria desnorteado pela escuridão, contaria aos outros o que viu e tentaria libertá-los. Que lhe aconteceria nesse retorno? Os demais prisioneiros zombariam dele, não acreditariam em suas palavras e, se não conseguissem silenciá-lo com suas caçoadas, tentariam fazê-lo espancando-o e, se mesmo assim, ele teimasse em afirmar o que viu e os convidasse a sair da caverna, certamente acabariam por matá-lo. Mas, quem sabe, alguns poderiam ouvi-lo e, contra a vontade dos demais, também decidissem sair da caverna rumo à realidade.

O que é a caverna? O mundo em que vivemos. Que são as sombras das estatuetas? As coisas materiais e sensoriais que percebemos. Quem é o prisioneiro que se liberta e sai da caverna? O filósofo. O que é a luz exterior do sol? A luz da verdade. O que é o mundo exterior? O mundo das idéias verdadeiras ou da verdadeira realidade. Qual o instrumento que liberta o filósofo e com o qual ele deseja libertar os outros prisioneiros? A dialética. O que é a visão do mundo real iluminado? A Filosofia. Por que os prisioneiros zombam, espancam e matam o filósofo (Platão está se referindo à condenação de Sócrates à morte pela assembléia ateniense)? Porque imaginam que o mundo sensível é o mundo real e o único verdadeiro.